17 de dezembro de 2012

Em defesa dos estivadores, eu me confesso

Para quem já estava farto de tentar impor o respeito aos seus filhos e concluído que nem o Homem do Saco nem o Bicho Papão resultavam, surge agora uma nova esperança com o novo, o horrífico, o mauzão… o Estivador.
Como tenho vindo a constatar que, no caso da greve dos estivadores, os pesos nos pratos da balança entre apoiantes e detractores estão muito desequilibrados, venho aqui deixar os meus 64 kg no prato dos apoiantes. A ver se a coisa fica um nadinha mais equilibrada.
Ao longo das últimas semanas, todos vimos nascer uma nova categoria de monstro. Para quem já estava farto de tentar impor o respeito aos seus filhos e concluído que nem o Homem do Saco nem o Bicho Papão resultavam, surge agora uma nova esperança com o novo, o horrífico, o mauzão… o Estivador.
Honra seja feita ao Governo que conseguiu criar esta nova personagem junto da opinião pública. Bastou lançar uns rumores acerca dos vencimentos e das regalias dos estivadores e, em menos de nada, conseguiu o feito de pôr pessoas, a quem fez tremendos cortes nos rendimentos, a revoltarem-se contra a única classe de trabalhadores que, até hoje, fez alguma frente de verdade ao próprio Governo. Tem havido outras greves e manifestações mas nada que faça o Governo recuar, com excepção da TSU. Quer dizer, quando há manifestações à porta da Assembleia em dia de votação de uma determinada lei, o Governo recua ou avança, mas apenas na hora da votação para não coincidir com a chegada dos manifestantes. Mas isso devem ser coincidências.


Todos querem alguém que faça frente ao Governo, mas quando aparece quem o faz, primeiro é preciso ver a sua folha salarial. É sabido que, neste país, só se pode queixar quem ganhar menos que o salário mínimo. Até parece que os estivadores não sofreram já com os mesmos cortes e aumento de impostos. E ao fazerem greve, mesmo que apenas às horas extraordinárias, fazem-no às suas custas, em protesto contra a precariedade em que a sua profissão corre o risco de ficar.

É isso e o facto de se ter descoberto que para entrar na estiva é mais fácil sendo familiar ou amigo de alguém que já lá esteja. Ui ui. Uma tremenda imoralidade. Aliás, este é um dos factores que mais revolta tem levantado nas pessoas e nos políticos. E com toda a razão. Sim, porque uma coisa é a Ministra do Ambiente contratar a irmã da Ministra da Justiça, obviamente pelo extraordinário currículo, outra coisa é os estivadores fazerem isso (até porque duvido muito que a irmã da Ministra perceba alguma coisa de como carregar um navio).

Claro que nem toda a gente tem a sorte de trabalhar em sectores supostamente tão pequenos, unidos e poderosos como a estiva ou os partidos políticos, mas a ideia que dá é que as pessoas que criticam a greve dos estivadores são aquelas que, há muito, abdicaram do seu direito de reivindicar contra as dificuldades que lhes são impostas e procuram consolo na miséria alheia. É mais fácil suportar as dificuldades sabendo que não se está sozinho.

Apesar de todo o poder que lhes é atribuído, foram precisos três meses de greve dos estivadores para que o Governo aceitasse apresentar uma proposta alternativa à primeira lei. Três meses. Cá para mim, fizeram essa proposta nos dois dias antes de a apresentarem porque o resto do tempo devem ter estado escondidos atrás dos contentores a ver se os malandros desistiam da greve. Mas não desistiram. E com isso conseguiram que o Governo fizesse algumas cedências a uma lei imposta pela tia Merkel, com o objectivo de perceber se por cá a coisa corre bem para depois se implementar igual no resto da Europa. É como os medicamentos novos. Primeiro testam-se no terceiro mundo e só depois se usam no primeiro. Tal e qual.

De qualquer das formas, alguns sindicatos já suspenderam a greve e já são poucos os que ainda a mantêm. Por isso, estou optimista – mais três mesitos, dois ou três telefonemas do Passos à Merkel a ver se pode ceder aqui e ali, e a coisa está resolvida.
 
 

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