25 de agosto de 2011

História trágico-marítima

Ílhavo, 5 – Um submarino alemão, que apareceu à vista da barra de Aveiro, canhoneou o vapor “Desertas”, ali encalhado desde 16 de Novembro de 1916, sem ter conseguido atingir o alvo. Imediatamente, da base naval francesa voaram dois hidroaviões, que procuraram bombardear o submarino, mas este submergiu, sendo perdido de vista.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de 6 de Setembro de 1918) 
O vapor "Desertas" encalhado na Costa Nova
Foto de Henrique Ramos - Arquivo Digital de Aveiro 
Ílhavo, 6 – Ontem, cerca das 4 horas da tarde, um submarino alemão bombardeou o vapor “Desertas”, há tempo encalhado perto da Costa Nova e que em breve será posto a navegar, depois de custosos e arriscados trabalhos hidráulicos. Do ataque foram ouvidos fortes detonações de canhão, vindos do lado do mar. As pessoas que acorreram a ver do que se tratava, puderam distinguir perfeitamente um grande submarino, que navegava a pouca distancia da praia. Pouco depois o bombardeamento recomeçou intensamente, sendo alvejado o vapor “Desertas”, as dragas que trabalhavam no seu salvamento e as oficinas provisórias ali instaladas. O numeroso pessoal que ali trabalha, talvez perto de 200 pessoas, tomadas de um pânico indescritível, procuraram salvar-se, umas fugindo numa correria vertiginosa, outras lançando-se por terra. Dentro em pouco, todo o local se achava envolto por densas nuvens de fumo e areia, que as granadas produziam.
Os banhistas da Costa Nova, que tinham acorrido a presenciar o estranho acontecimento, tiveram rapidamente a visão de uma grande catástrofe, tal era o espectáculo horroroso e imprevisto a que estavam assistindo. E, assim, aterrados, gritos aflitivos se ouviam por toda a praia, aquela hora extraordinariamente concorrida. Receando que o bombardeamento atingisse os prédios, todos procuraram pôr-se a salvo, tomando a estrada da Barra em direcção a Aveiro e a maior parte embarcando para fazer a travessia da ria, em direcção à margem da Gafanha, para alcançarem Ílhavo. Como tudo foi feito sobre uma forte impressão de terror, aconteceram desmaios, cenas lancinantes e pequenos desastres, chegando a cair algumas pessoas à água na precipitação da fuga. Mas, decorrida talvez meia hora, o bombardeamento parou e pode verificar-se que os seus resultados não tinham sido como antecipadamente se previra. Apenas uma das dragas sofreu pequenas avarias, não havendo desastres pessoais de grande importância.
Decorrida cerca de 1 hora, da estação naval francesa de S. Jacinto elevaram-se alguns hidroaviões que seguiram em direcção ao mar, procurando atacar o submarino, chegando até a lançar algumas bombas, mas sem resultados práticos Receia-se que novo ataque venha a dar-se, pois há fortes razões para julgar que os alemães sabem que o “Desertas” vai, finalmente, ser posto a navegar e procuraram, antes disso, inutilizá-lo. Convém tomar medidas que contrariem o seu empenho. O caso é que este não esperado incidente, aliás de bastante gravidade, veio alarmar toda a colónia de banhistas da linda praia da Costa Nova, tendo-se dado nestes dias um verdadeiro êxodo. Mas a serenidade deve regressar em breves dias, tudo voltando ao estado primitivo, continuando o entusiasmo e animação, que são tradicionais naquela ridente praia.
(In jornal “O Comércio do Porto”, de Domingo, 8 de Setembro de 1918). 

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